segunda-feira, 9 de abril de 2012

Como Kant se Posiciona diante da Controvérsia entre Racionalismo e Empirismo

Análise da seção I da introdução da Crítica da Razão Pura,
denominada Da diferença entre conhecimento puro e empírico


Resumo


A seção I da Introdução da Crítica da Razão Pura aponta uma crítica à forma de empiristas e racionalistas tratarem a matéria do conhecimento. Permeado pela tradição da filosofia idealista, Kant constrói uma ponte com os conceitos do apriorismo e do aposteriorismo e propõe uma forma exigente de pensar a epistemologia.  
“as aparências devem ser consideradas como sendo, todas elas, apenas representações, não coisas-em-si, e que tempo e espaço são, por conseguinte, apenas formas sensíveis de nossa intuição, não determinações dadas como existindo por si mesmas, nem condições dos objetos vistos como coisas-em-si” (Kant)

1.      Todo o nosso conhecimento começa com a experiência[1]


Kant despertou de sua modorra dogmática[2] ou, sono metafísico[3]. Até a Crítica da Razão Pura o conhecimento andava por vias dogmáticas ou céticas. Ora tropeçava para a afirmação absoluta de que era possível conhecer, ora tombava para o caminho duvidoso dos examinadores e pragmáticos. As respostas racionalistas e empiristas formavam uma gigantesca muralha em torno da questão epistemológica, e dentro desta fortaleza, o conhecimento se via protegido dos ataques ameaçadores do gigante prussiano de Königsberg.  De longe, o colosso do idealismo crítico armou a catapulta e laçou sua primeira pedra de fogo: “todo o conhecimento começa com a experiência”. Esta é uma sentença consensual de Kant. Abre o diálogo com o empirismo, para quem “todo conhecimento é atribuído aos sentidos [os quais] não podem apreender o absoluto[4]”. 

Segundo FERRATER,
Há três tipos de empirismo: o psicológico, o gnoseológico e o metafísico. Para o primeiro, o conhecimento tem integralmente a sua origem na experiência; o segundo defende que a validade de todo o conhecimento radica na experiência; o último afirma que a própria realidade é empírica, isto é, que não há outra realidade para além da que é acessível à experiência e em particular à experiência sensível[5]”.

O empirismo revisado na Crítica corre dentro do canal da filosofia moderna de Francis Bacon (1561-1626), Thomas Hobbes (1588-1679), John Locke (1632-1704), George Berkeley (1685-1753) e David Hume (1711-1756). Kant aceita a possibilidade empírica do conhecimento, mas cerceado pelas condições parciais de nossa humanidade, ou seja, como via primária para o saber das coisas, mas não suficiente, ou, necessária: “Conhecemos apenas o fenômeno, o que nos aparece e segundo nossas condições, mas a coisa em si, isto é, como ela é, tal nos escapa ao conhecimento[6]”.

2.      Nem por isso todo ele se origina justamente na experiência


Com esta sentença, Kant abre diálogo com o racionalismo. Na verdade, é sua segunda pedra de fogo, com a qual alveja a filosofia de René Descartes (1596-1650), Nicolau Malebranche (1638-1715), Blaise Pascal (1623-1662), Benedictus Spinoza (1632-1677) e Gottfried Wilhelm Leibnitz (1648-1716). Mário Ferreira dos Santos diz que:

“Ele permanece fiel ao primeiro postulado do racionalismo; isto é, que toda experiência é um pensar. Daí que todo pensar seja um julgar, e todo julgar o completar uma síntese por categorias, isto é, síntese nas formas do intelecto[7]”.

A postura kantiana ante o dilema é de alargamento das funções racionais e empíricas. Ao despertar do sonho metafísico, ele não quer voltar ao sono e estreitar a possibilidade do conhecimento. Segundo Hamilyn, “o declarado objetivo de Kant é solapar as alegações de uma suposta faculdade de razão pura, que poderia chegar às verdades sobre o mundo ou sobre a realidade independentemente da experiência[8]”. Ele rebatiza conceitos em sua Crítica, chamando o conhecimento empírico de a posteriori e o racional de a priori ou puro. Isso lhe permite revisar a epistemologia agregando-lhe nomenclaturas que distinguem o juízo analítico do sintético. Feitas as disjunções, ele parte num segundo momento para as conjunções. Os termos de unem para classificar o juízo como analítico, sintético a posteriori e sintético a priori

3.      Conclusão


Kant se posiciona pelo criticismo ante o empirismo e o racionalismo. Embora ceda espaço para um e outro com o fim de manter o diálogo, procura apontar para as limitações de ambos os métodos. A limitação da experiência é o subjetivismo e o particularismo. Carece de universalidade e de necessidade. A limitação da razão é o horizonte do fenômeno. A tese de Kant é que temos que supor que as representações são de alguma maneira, devidas ao que ele chama de coisas-em-si, mas não podemos ter conhecimento delas.

Referências Bibliográficas


HAMLYN, David Walter - Uma História da Filosofia Ocidental
MORA, José Ferrater, Dicionário de Filosofia, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1978
SANTOS, Mário Ferreira dos, Convite à Filosofia e à História da Filosofia, São Paulo, Ed. Logos



[1] O texto utilizado é uma tradução de Valeri Rohden e Udo Baldur Moosburger (Os Pensadores, Nova Cultural)

[2] Kant alega[va] que fora a leitura de Hume (não está claro o quanto) que o despertara de sua “modorra dogmática (HAMLYN, David Walter - Uma História da Filosofia Ocidental)

[3] Kant foi “despertado do sono metafísico” pelo pensamento de David Hume cujas análises, especialmente do conceito de causalidade, demoliam as pretensões do dogmatismo metafísico de afirmar verdades eternas a respeito da essência ultima das coisas. (Introdução à Crítica da Razão Pura, coleção Os Pensadores, editora Nova Cultural).

[4] SANTOS, Mário Ferreira dos, Convite à Filosofia e à História da Filosofia, São Paulo, Ed. Logos. p.80

[5] MORA, José Ferrater, Dicionário de Filosofia, Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1978
[6] SANTOS, Mário Ferreira dos, Ibid, p.61
[7] Ibid, 84
[8] HAMLYN, David Walter - Uma História da Filosofia Ocidental

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